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Texto: Jacqueline Nóbrega Publicado em

Somente em 2017, aconteceram 2.932 milhões de desembarques no Aeroporto Pinto Martins, em Fortaleza, de acordo com a Empresa Brasileira de Infraestrutura Aeroportuária (Infraero), até então administradora do equipamento. No entanto, o que muita gente desconhece é que o terminal também possui um cemitério de aviões. De acordo com a Fraport, atual administradora do Aeroporto de Fortaleza, desde janeiro de 2018, o cemitério de aviões do Pinto Martins reúne sete aeronaves.

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Seis delas são pertencentes à empresa TAF Linhas Aéreas S.A., de Fortaleza, e a sétima é do Departamento de Polícia Judiciária de São Paulo Interior (Deinter). As aeronaves pousaram no equipamento entre os anos de 2007 e 2010. Ainda segundo a administradora, elas estão paradas devido a dívidas com o Aeroporto de Fortaleza. Como a área é restrita, não é permitida a entrada do público no local para visitação.

De acordo com o professor titular do Departamento de Transporte Aéreo do Instituto Tecnológico de Aeronáutica (ITA), Cláudio Jorge Pinto Alves, o cemitério é o local, de preferência sem utilidade dentro de um aeroporto, onde se 'guardam' aeronaves que não deverão mais operar. "Existem cemitérios em lugares apropriados, com o clima seco, por exemplo, para guardar o avião até eventualmente sua reutilização. Esses cemitérios estão em regiões desérticas dos Estados Unidos por exemplo, no Deserto de Mojave", explica.

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Fotos: Fraport/Divulgação

No caso do Brasil, o principal motivo da existência de cemitérios, a exemplo do Pinto Martins, são dívidas aeroportuárias. "No Brasil, empresas falidas que ainda sofrem pendências judiciais com seus credores ficam com suas aeronaves 'presas' sem poder serem vendidas. Acabam se deteriorando no cemitério pois os processos judiciais, e suas decisões, são normalmente muito lentos".

Segundo o professor, o ponto negativo dessas aeronaves ficarem paradas é que elas não pagam tarifa e ocupam um espaço do aeroporto que poderia ser aproveitado de outra forma. "A solução é se definir um espaço de menor 'valor' comercial para abrigá-las e contribuir, dentro do possível, para a mais rápida solução do impasse judicial".

Infográfico TAF

Cláudio ainda relata que não compensa a reutilização das peças dessas aeronaves paradas. "Algumas peças podem ser recicladas, desde que em oficinas credenciadas pela Agência Nacional de Avião Civil (ANAC), mas, na maioria dos casos, não compensa e acabam vendidas a quilo no 'ferro-velho'. Isso decorre da demora em se solucionar as pendências judiciais em que as aeronaves compõem os bens de um dos contentores".

O professor afirma que todos os grandes aeroportos brasileiros têm cemitérios. Ele deu o exemplo de São José dos Campos, onde o ITA fica localizado. "A Embraer está pedindo a remoção do cemitério para uso da empresa, mas a Infraero, administradora do aeroporto, se depara com problemas na Justiça para se livrar das carcaças enferrujadas das aeronaves lá expostas".

No caso das aeronaves paradas no Deserto de Mojave, Cláudio diz que a maioria dos aviões são posteriormente comprados para uso em filmes, por exemplo. "Outros vão sendo depenados", finaliza.

Cinema-avião

Em imagem feita por drone, é possível ver o DC-3 no Apoena Ecopark Foto: Arquivo/Apoena Ecopark

Em 2007, uma das aeronaves que estava parada no Aeroporto Pinto Martins foi doada pelo fundador e diretor executivo da TAF, João Ariston Pessoa Filho, ao Apoena EcoPark, localizado em Pacatuba. A ideia, de acordo com Lucas Leal, coordenador comercial do espaço, era colocar pedaços do avião em uma trilha que existe no Ecopark para deixá-la misteriosa. Como ganharam o avião inteiro, um Douglas DC-3 bimotor, surgiu a ideia de transformar a aeronave em um cinema.

Lucas conta que o avião foi fabricado em dezembro de 1935 pela empresa americana Douglas. Ele foi usado durante a Segunda Guerra Mundial para transportar militares paraquedistas. "Foi utilizado também pelos Correios e para transporte comercial de passageiros. Voou até 1991", relata.

Para a experiência ficar ainda mais especial, um filme foi pensado especialmente para o cinema-avião, que dispõe de 20 assentos. Na história, duas garotas e um garoto viajam para São Paulo, quando o avião sofre uma pane e é obrigado a fazer um pouso de emergência no Apoena.

"Neste ínterim, os garotos são sugados por uma árvore mágica e entram numa dimensão onde vivem uma aventura com o Índio Apoena. Nesta experiência, aprendem grandes lições ecológicas e se tornam Guardiões da Natureza", completa.

"A ideia é original. Pensamos em oportunizar a visita à uma aeronave histórica e ainda por cima transmitir conhecimentos de geografia e ecologia aos visitantes", finaliza. O Apoena Ecopark funciona aos sábados e domingos, de 9h às 17h.

Solução: levar as peças para um museu

Para ser levado para a Alemanha, o avião foi dividido em nove parte
Para ser levado para a Alemanha, o avião foi dividido em nove partes Foto: AFP

Em setembro do ano passado, outra boa solução foi encontrada para uma aeronave parada no Pinto Martins. O Boeing, chamado de Landshut, estava estacionado no cemitério de aviões do Aeroporto há nove anos. Ele foi adquirido junto à Infraero pelo Governo Alemão para ser repatriado e exposto em um museu particular na cidade de Friedrichshafen, em comemoração aos 40 anos do Outono Alemão, marco histórico do combate ao terrorismo naquele país.

O Boeing 737-200, que fazia parte da frota da Lufthansa, foi sequestrado no ano de 1977 com 91 pessoas a bordo por membros do grupo terrorista de extrema esquerda RAF (Fração do Exército Vermelho). A ação durou cinco dias e terminou com a morte do piloto e de mais três sequestradores e deixou o mundo em choque.

Depois do sequestro, a aeronave continuou transportando passageiros da Lufthansa até ser vendida pela empresa alemã em 1985. O Landshut teve vários proprietários e passou a levar cargas. Até 2008, ele voou pela TAF.

Para ser levado para a Alemanha, o avião foi dividido em nove partes e separado em seis embalagens: fuselagem, as duas asas, o leme, os estabilizadores e as turbinas.

Book de casamento no cemitério

Átila e a esposa fizeram o tradicional book de casamento no cemitério de aviões do Pinto Martins
Átila e a esposa fizeram o tradicional book de casamento no cemitério de aviões do Pinto Martins Foto: Arquivo pessoal

O analista de sistema Átila Lima, antes de se casar, teve a ideia de fazer um book com a esposa em lugares que fossem a 'cara do casal'. Apaixonado por aviação, sugeriu que parte das fotos fossem feitas no cemitério de aviões do Aeroporto, já como ela é louca por futebol, as outras imagens foram registradas na Arena Castelão.

"Eu sempre fui fascinado pelos aviões, sempre que posso acompanho as movimentações de pousos, decolagens e demais movimentos aqui em Fortaleza. Conheci o cemitério de aviões em 2015, em um Spotter Day, na época realizado pela Infraero", conta ele.

"Na realidade, minha esposa tem muito medo de aviação. Ela me acompanha em alguns eventos, mas prefere os aviões em solo. Sempre quando viajamos ela fica muito tensa", completa.

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Como o cemitério não é aberto ao público, Átila enfrentou algumas burocracias antes de conseguir que o casal fosse fotografado no local, em janeiro do ano passado. Entrou em contato, primeiro, com a Infraero, esclareceu que tem conhecimento sobre a segurança necessária para adentrar a um local como o cemitério e mostrou que já tinha participado de eventos realizados pela empresa. Assim, a antiga administradora do Pinto Martins informou o procedimento que Átila deveria seguir.

"Me informaram sobre o pagamento de taxas, regras, entre outras condições. No dia fomos acompanhados por um fiscal da Infraero e tivemos 60 minutos para a realização das fotos", relata.

Como atualmente o cemitério tem poucas aeronaves, transformar o local em museu não é uma boa solução na opinião de Átila. "Se o espaço fosse aberto ao público como um museu, acho que teríamos poucos acessos. Infelizmente temos um pensamento diferente de outros países com relação à cultura da aviação. O Museu da TAM (localizado em São Carlos, São Paulo), por exemplo, vai fazer dois anos que está fechado por falta de recursos. Já em 2017 o Boeing 737-200 da ATA Brasil que estava no cemitério foi totalmente destruído", lamenta.

Outros aeroportos

Vale pontuar que, de acordo com o gerente de aeroportos do Departamento Estadual de Rodovias (DER), coronel Paulo Edson, não existem cemitérios de aviões nos aeroportos administrados pelo órgão. São eles os aeroportos de Aracati, Campos Sales, Crateús, Itapipoca, Limoeiro do Norte, Russas, Sobral, Camocim, Canindé, Iguatu, Jericoacoara, Quixadá, São Benedito e Tauá.

Serviço

Apoena Ecopark
Endereço: Rua Major Crisanto de Almeida, 2170, Centro - Pacatuba-CE
Contato: (85) 98802.3400
Site: www.apoenaecopark.com.br