Diário do Nordeste Plus

Arte no corpo

O mercado de tatuagens em Fortaleza está em alta, revelando profissionais gabaritados na área e um público-alvo e “colorido” cada vez mais heterogêneo

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Uma das primeiras formas de expressão artística de que se tem notícia, a tatuagem “coloriu” a história de diversos povos, ao longo dos séculos e, atualmente, considerada moda na aldeia global, ganha forma de status, rito de passagem, sinônimo de estética e/ou até significado funcional e de resgate de autoestima.

Foi o tempo em que falar sobre tatuagem em Fortaleza se resumia à Galeria Pedro Jorge, conhecida Galeria do Rock. A arte estampada no corpo ganhou outros sentidos: rememorar, ressignificar, embelezar, ligar e marcar, sendo proveniente das diversas motivações conectadas às experiências de vida de cada tatuado, independente do sexo, classe social, cor ou idade. O público consumidor mudou, o perfil dos profissionais também. Amanda Rossevelt é uma das tatuadoras que se encaixam nesse novo perfil. Com apenas 21 anos, ela se destaca no mercado local como uma “expert” em aquarela, indo contra os esteriótipos.

Amanda Rossevelt

Amanda Rosevelt. Foto: José Leomar


Começou a tatuar aos 19, após ter contato com local onde trabalha atualmente, o Kaleidoscope Studio. “Eu sempre gostei de desenhar. Primeiro segui o caminho da moda, mas precisava que fosse um desenho mais livre. Eu conheci o Júnior que viu alguma coisa no meu traço. Daí, eu fiquei “estagiando” aqui e daí fiquei. Eu sei que o meu perfil de profissional e de trabalho são seria tão aceitável há uns 10, 15 anos. Eu não vou dizer que hoje rola preconceito, já que é uma palavra muito pesada, mas as pessoas se assustam quando me veem pessoalmente por causa da minha idade”, destaca

O preconceito, que fazia muitos torcerem o nariz, julgar e tachar pessoas com alguma modificação na pele, é bem menos sentido nos dias de hoje. Tanto por quem tatua quanto por quem escolhe marcar a pele. Jack Anderson Carneiro Parente, 36 anos, conta que já atendeu algumas pessoas que sempre sonharam em se tatuar, mas que, devido ao má julgamento de outrora, não tiveram coragem de fazer. “ Pessoas de diferentes perfis e faixas etárias estão se tatuando. Tive uma cliente com mais de 70 anos que sempre quis, mas era impossível quando era jovem. E outros também”, afirma.



Companheiro de trabalho de Jack, o jovem Ben-Hur também enfrentou o preconceito dentro de casa. Aos 25 anos, ele era estudante de Arquitetura quando chegou a abandonar o emprego em um banco para trabalhar como tatuador. “Um dia uma amiga chegou e pediu que eu fizesse um desenho, pois ela iria tatuá-lo. No dia da tatuagem eu a acompanhei, e tive um contato direto com o mundo da tatuagem, o dia-a-dia do profissional e tal, isso que me chamou a atenção. Desde novo eu sonhava em trabalhar diretamente com desenho. Lembro que depois daquele dia eu cheguei em casa e falei "mãe, já sei o que quero pra minha vida"... Da pra imaginar a cara dela”, revela.

Jack Anderson

Jack Anderson. Foto: Bruno Gomes


Tatuador há 11 anos, Amilton Inácio também percebe diferenças. Proprietário do Santa Tatuagem, Amilton destaca entre as principais alterações ao longo dos anos o material, o perfil de consumidores e a estrutura dos estúdios. “Duas coisas mudaram muito. Material e as pessoas que vinham procurar a gente. O material a gente tinha que preparar. As agulhas eram soltas (antes de mim, os caras ainda tinham que produzir a própria agulha), eu tinha que preparar meu material. Biqueira hoje é descartável, antes era esterilizável. Tinta era mais difícil de conseguir. Hoje o material tem todo o registro na Anvisa. Tá bem mais profissional. E também o público, que passou a consumir mais. Antigamente, quem vinha pra gente? Até hoje eu atendo pessoas que sempre quiseram fazer tatuagem, mas, devido ao preconceito, nunca fizeram, e hoje aparecem aqui para fazer, mesmo aos 60, 65 anos de idade. Esse novo consumo aumentou muito a indústria da tatuagem, surgindo novas empresas especializadas em produtos para tatuagem”, destaca Amilton.


Amilton Inacio

Amilton Inácio. Foto: Bruno Gomes

“Até hoje eu atendo pessoas que sempre quiseram fazer tatuagem, mas, devido o preconceito, nunca fizeram, e hoje vêm aqui para fazer, mesmo aos 60, 65 anos de idade”

Amilton Inácio

Outra mudança é percebida na estrutura dos estúdios. Localizado em um bairro nobre da Capital, o espaço abriga local para tatuar, cafeteria e uma barbearia. Outro estúdio que também foge do tradicional é o Metal Dog, onde são realizadas festas, como a Super Sausage Rock and Beer - evento com cervejas especiais, banda de rock e linguiças artesanais.

Amilton Inacio

Foto: Bruno Gomes

Mercado


Atualmente, o Brasil é considerado o 3º mercado de tatuagens do mundo, ficando atrás da Holanda e Estados Unidos. A popularidade é visível no número de espaços e grandes eventos especializados voltados exclusivamente para o segmento no Brasil: o Tattoo Fest, Tattoo Zone Rio Festival, a Convenção Internacional Tattoo Ink, o Tattoo Art Festival, SP Tattoo Festival, Encontro Nacional dos Tatuadores e Body Piercings do Braisl, entre alguns outros.

Mercado

Foto: Bruno Gomes


E o mercado continua crescendo. De acordo com pesquisas divulgadas pela Globonews, a cada dez pessoas entre 18 e 35 anos, três são tatuadas, quatro ainda pretendem fazer e três jamais fariam. Estima-se que esse mercado cresça, em média, 10% ao ano, sendo alterado o perfil de consumo. Do clássico, passando pelo Oriental, Maori, Realista, Old School, a tatuagem ganhou status de arte com grande representatividade para quem a tem.

Grandes tatuadores passaram a ter o status de "celebridades", sendo patrocinados por marcas de produtos, como tintas, máquinas, que custeiam despesas e passagens, em troca da divulgação e publicidades de seus materiais, principalmente em eventos. Alguns cachês chegam a R$ 12 mil. Na Europa, profissionais chegam a ganhar de 100 a 400 euros por hora de evento. A confirmação desse sucesso são programas dedicados ao tema exibidos em canais de TV (no Brasil, somente por assinatura), como "Miami Ink", "New York Ink", "Los Angeles Ink", que expõem o dia a dia dos estúdios e vida de tatuadores americanos consagrados.

Kiko

Kiko. Foto: Bruno Gomes


No Ceará, a realidade é diferente, porém favorável. De acordo com Kiko Inline, tatuador e sócio do Madame Tattoo, o mercado local está bem, com oportunidade para todos. Atuando há 11 anos no mercado, ele diz que o mercado local está segmentado, fazendo com que não haja interação entre tatuadores de diferentes estúdios. “Antigamente, a gente era focado em fazer tudo, e não em um estilo. O que viesse a gente fazia. Hoje não, os tatuadores estudam mais para dar continuidade ao estilo. Tem muita gente que foca muito em Old School, por exemplo. E hoje a demanda para o pessoal de classe média alta está bastante, bastante mesmo”, destaca. A segmentação traz, além da definição de um estilo, a identificação do tatuador pelo seu traço, o que o torna quase que “exclusivo”. Por isso, há grandes filas de espera para o atendimento em alguns estúdios.

Como exemplo está o estúdio de Jack Anderson Carneiro Parente, dono do Metal Dog Tattoo. Quem quiser uma arte com o traço de Jack terá que esperar até 2018.

De acordo com Ben-Hur de Souza Leite, o trabalho é rentável e satisfatório. O preço da arte varia de acordo com o tamanho e a complexidade do desenho. Há um preço mínimo para a realização do trabalho. No caso do estúdio onde atua, o valor é de R$ 170, podendo chegar a R$ 500 a sessão, caso seja até três horas. A cada hora excedente é cobrado R$ 150. Ao todo, Ben-Hur faz uma média de 40 sessões por mês.

Ben Hur

Ben Hur. Foto: Thiago Gadelha


Cada estúdio tem a sua regra de pagamento. E, de acordo com Kiko, o mercado está legal, com boa rentabilidade. Mas também é preciso estudar. Ele, por exemplo, faz um número x de tatuagens e retira parte do tempo para estudar. Porém, para quem está querendo começar a navegar pelas águas dessa arte, é preciso, antes de tudo, estar consciente do trabalho a ser desenvolvido. “A gente sabe que não é fácil tatuar no corpo alheio. Por isso tem que ter qualificação, é uma marca, não tem como voltar. E como não existe faculdade ou curso especifico, a pessoa tem que praticar muito. É meter as caras”, destaca.


Tatuando

tatuando

Foto: Bruno Gomes


Apesar dessa quase “reinvenção”, algumas atenções continuam válidas no mundo da tatuagem. A arte só pode ser aplicada em maiores de idade. “Não tatuo menores de idade. A pessoa tem que ter maturidade, saber o que realmente quer. Normalmente uma pessoa muito jovem não tem uma ideia amadurecida, consolidada. A pele ainda está em crescimento”, destaca Jack Anderson.

“Não tatuo menores de idade. A pessoa tem que ter maturidade, saber o que realmente quer. Normalmente uma pessoa muito jovem não tem uma ideia amadurecida, consolidada. A pele ainda está em crescimento”

Jack Anderson

Alguns lugares também não costumam ser apreciados pelos profissionais. Regiões como dedos, pescoço, lábio, olhos e até os pés podem ser passíveis ou não de tatuagem. De acordo com Kiko, essas são regiões que precisam de muito cuidado. “Dedo e lábio eu não tatuo. É uma região complicada, que troca de pele direto, então o resultado não fica tão legal. Quando eu olho que o pé é muito ressecado ou muito enrugado, eu particularmente não faço. Joelho, cotovelos são locais mais para ‘complemento’ para quem quer fechar o braço, por exemplo”, afirma.



cuidados

História da tatuagem

historia tattoo

Foto: Bruno Gomes


Tudo leva a crer que a prática de marcar o corpo é tão antiga quanto a humanidade. No Egito antigo, entre 2160 e 1994 a.C., múmias femininas apresentavam traços e pontos escritos na região do abdômen, numa alusão possível à fertilidade da mulher. Além do uso em rituais, as tatuagens serviram para identificar castas, grupos sociais, seitas, prisioneiros, ornamentação e até mesmo como camuflagem corporal.

Com a chegada da Era Cristã, a técnica caiu em desuso no Ocidente e foi proibida. Em 1769, o navegador inglês James Cook realizava uma expedição à Polinésia e registrou o costume dos habitantes daquela localidade em seu diário de bordo: “homens e mulheres pintam o corpo. Na língua deles, chamam isso de tatau. Injetam pigmento preto sob a pele de tal modo que o traço se torna indelével”.

O hábito se espalhou pela Europa e pelos Estados Unidos. Até o fim do século XX, a pele desenhada, até então era quase uma exclusividade de marinheiros e presidiários, o que rememora o estilo "Old School".

No Brasil, essa arte chegou em 1959, trazida pelo dinamarquês Knud Harald ‘Lucky’ Gegersen, mais conhecido por Lucky ou Mr. Tattoo, um dos precursores da arte em seu formato moderno. Ele se estabeleceu em Santos e ganhou muito destaque na mídia em sua época, sendo considerado por muito tempo como “o único tatuador profissional da América do Sul”. Ele morreu em 1983 e deixou muitos seguidores pelo Brasil, que garantiram a perpetuação de sua arte.


cuidados

Serviço


Santa Tatuagem
Contato: 3244-7274
Facebook: facebook.com/santatatuagem
Instagram: instagram.com/santatatuagem/

Madame Tattoo
Contato: 9 8730-5744
Facebook: facebook.com/madametattoo
Instagram: instagram.com/madame_tattoo/

Kaleidoscope Studio
Contato: 3253-1806
Facebook: facebook.com/KaleidoscopeTattooStudio

Metal Dog
Contato: 3224.1009
Facebook: facebook.com/MetalDogTattoo
Instagram: https://www.instagram.com/metaldogtattoo/