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Texto: Aline Conde Publicado em

O fim de um casamento, muitas vezes, é considerado um grande fracasso para as partes envolvidas. A ideia, no entanto, tem sido ressignificada por pessoas que acreditam que não há fim após uma história e que o bom convívio e a harmonia entre as partes são totalmente possíveis.

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A separação humanizada é um termo que está sendo cada vez mais usado, entre os casais que se divorciam de forma tranquila, entre psicólogos e até mesmo entre os advogados, que buscam a minimização dos impactos negativos em um divórcio. O Diário do Nordeste Plus reuniu casos de pessoas que tiveram uma separação branda e acharam o equilíbrio para conviver com o ex-companheiro (a).

Sempre uma família: Edith Gomes, ex-marido e o filho do casal

A influenciadora digital Edith Gomes tem um bom convívio com o ex-marido, Yuri Frota, com quem teve o pequeno Yan. Casados durante 3 anos e 8 meses, ela explica que, assim como qualquer outra separação, o período foi difícil. “A gente conversou e chegou no consenso de buscar a felicidade de cada um sozinho. Claro que no começo toda separação é muito dolorosa e foi difícil. Só que a gente sempre manteve na cabeça que o nosso foco era o Yan. A gente passou por cima de muita coisa, do nosso ego, para buscar o melhor para ele, que era a gente se dar bem, vivendo em harmonia e não necessariamente nós dois estando juntos e não felizes”, afirma.

Sempre é tudo muito conversado. O pai dele pode chegar na nossa casa quando quiser, ver o filho quando quiser. Os avós são muito presentes
Edith Gomes, digital influencer

A separação do ex-casal foi bastante tranquila, uma vez que eles entraram em consenso sobre tudo, especialmente sobre a vida do filho. A criança passa a semana com Edith para cumprir uma rotina de estudos e atividades. Nos fins de semana, Yan aproveita o pai, mas quando necessário fica um dia com Edith e outro com Yuri. “Sempre é tudo muito conversado. O pai dele pode chegar na nossa casa quando quiser, ver o filho quando quiser. Os avós são muito presentes. Então, é tudo muito tranquilo. Tudo é compartilhado e conversado em relação ao Yan, sobre escolhas e o futuro dele”, relata.

No aniversário de Yan, Edith posou ao lado da família, do pai de Yan, Yuri, e do atual namorado Foto: Reprodução / Instagram

Recentemente, Yan fez 4 anos e a família comemorou com uma festa de aniversário. Nas redes sociais, Edith postou uma foto de toda a família em que aparece o pai de Yan e o atual namorado da influenciadora. “Foi um momento especial, mas ali não é nada mais, nada menos que um momento normal. E em relação ao pai do meu filho, vai ser sempre o pai do meu filho para o resto da vida. Quem vier a estar comigo, vai sempre saber disso. Por mais que eu e o Yuri não estejamos mais juntos, sempre vai ser uma família porque envolve o Yan. Sempre vai ser o melhor para o Yan, e o melhor para ele é a gente conviver em harmonia”, ressalta, comentando ainda que “mãe e pai são para o resto da vida”.

Edith diz que apesar de separados, ela e Yuri são uma família pois envolve o filho dos dois
Foto: Reprodução/Instagram

Filha de pais separados, a influenciadora relembra que não teve uma boa experiência e que não quer proporcionar o mesmo ao filho. "Meus pais são separados e eles não tiveram um bom convívio. Eu acho que, pegando esse exemplo, a gente fez tudo diferente. O Yuri é o pai do meu filho e uma pessoa sensacional em relação a isso”, revela Edith, mostrando que é possível existir amizade após o casamento.

Amizade com a esposa do ex-marido

A advogada Lelia Cordeiro e Acácio Mourão foram casados durante 6 anos e meio e, em 1984, os dois resolveram se divorciar. “A nossa separação, como todas, foi complicada. O motivo foi a total incompatibilidade de gênios”, revela Lelia, que teve duas filhas com o ex-marido. Os dois descobriram que se davam melhor como amigos.

Acácio Mourão é casado com Célia Jatahy, mas viaja com a ex-esposa e a filha Foto: Arquivo Pessoal

Após casar-se com Maria Célia Jatahy, Acácio apresentou a atual esposa para Lelia e as duas logo tornaram-se amigas. “Ele é o pai das minhas filhas. Eu o respeito, ele me respeita. Temos uma relação de amizade. Vou na casa deles e eles vêm na minha e sempre nós ajudamos. Já viajamos para o Chile e Suíça juntos e é muito bom viajar com os dois”, detalha Lelia. A advogada até brinca: “Ele é um bom amigo. Já como marido melhor que seja da Célia mesmo”.

Lelia é amiga da atual
do ex-marido Foto: Arquivo Pessoal

Assim como Edith Gomes, ela comenta que o diálogo é essencial e até pontua alguns detalhes para quem estiver passando por uma separação. “Basta que as pessoas apliquem nas relações um princípio básico de respeito. Que não esqueçam do diálogo, sem cobranças, pois as promessas feitas nos momentos de paixão só valem para aqueles momentos".

"No resto do tempo o que vale são os objetivos de vida: Você realmente acredita na instituição do casamento? A outra pessoa possui elementos ou qualidades as quais você admira? Afinal, não amamos quem não admiramos. O casal é compatível e gosta de coisas pelo menos parecidas? É verdade que os opostos se atraem, mas não se mantém uma relação boa quando se tem que gastar muita energia para ficar nela. A felicidade deve estar em você e não no outro. Então seja feliz”, afirma Lelia.

Essa coisa de odiar o ex é antiquada, saiu de moda, não dá mais para usar Lia Bock, é ex-mulher de Ivan Martins e juntos criaram o projeto ‘Ex-casados’

Alimentando a relação de ex-casal

Os jornalistas Lia Bock e Ivan Martins foram casados durante 4 anos e já estão separados há 12. No início da separação, eles se afastaram e deixaram de se falar, mas logo depois voltaram a conviver, principalmente nos aniversários deles, nos eventos e festas comemorativas, como o Natal. "Temos muitos amigos em comum, e a gente sempre se gostou e tivemos uma relação legal. Conseguimos ficar com a parte boa. O Ivan casou, eu casei, tive filhos... e a gente se reaproximou de uma outra maneira, carinhosa” explica Lia.

Muita gente acha que se separou e é o fim e que não tem que fazer mais nada por essa relação. Não, mesmo separado, é uma relação, uma relação de ex-casal
Lia Bock, jornalista

Ela relembra a separação como um momento triste, mas relativamente tranquilo, uma vez que não houve confusões. “A gente casou para ficar junto para sempre. Eu tinha muitas expectativas e acreditava muito nisso, então quando o casamento começou a desandar, não estávamos mais bem, estávamos ali batendo cabeça, foi triste constatar, mas foi consensual. Não teve um estresse muito grande, a gente não se matou, nada disso. Foi melancólico, triste. Não foi uma separação com briga e muitos desentendimentos, foi uma coisa que foi acontecendo. Eu acho que talvez seja o jeito mais fácil de se separar, porque quando um só quer separar e o outro não quer, ou quando tem alguma traição ou alguma coisa bombástica, realmente fica um pouco mais complicado”, afirma a jornalista, que já casou 4 vezes. Ivan teve 3 casamentos.

Lia comenta que o ciclo do casamento se encerrou e que renasceu uma amizade entre os dois, que acabou sendo intensificada mais ainda quando eles resolveram criar um canal no YouTube sobre o tema. Denominado de "Ex-Casados", o canal reúne vídeos, que saem toda quinta-feira, às 10h, sobre sofrência, discussão de casamento, carência e outros temas.

A jornalista comenta que o canal foi feito para falar sobre as novas configurações de relacionamentos e até de família. A ideia é deixar o assunto mais comum para ser discutido e encarado.

“Esse é um tema que precisamos falar. Casamento não é mais aquela coisa que você casa uma vez, separa uma vez e chama o ex-marido de falecido e a ex-mulher de falecida. Hoje em dia o mundo se apresenta de uma outra maneira, onde a gente casa e separa diversas vezes, então a gente tem vários ex-maridos e várias ex-mulheres. A gente tem que saber lidar com isso. Vamos ficar apagando partes das nossas vidas, pessoas que passaram, chamar todo mundo de falecido? E os amigos que nós temos dessas relações? Também apaga todo mundo? Quer dizer, é uma dinâmica nova. É uma realidade que temos que encarar. Essa coisa de odiar o ex é antiquada, saiu de moda, não dá mais para usar. Porque ela pertence a outro tempo, onde a gente tinha só um ex-marido, agora a gente tem vários e como é que a gente vai lidar com isso?”, reflete Bock.

Há vida lá fora e que a separação não é o fim de nada, e sim o começo de uma outra coisa
Lia Bock, jornalista

Para ela, até a relação com um ex-marido ou ex-esposa precisa ser cuidada, principalmente se o casal tiver filhos. “Muita gente acha que se separou e é o fim e que não tem que fazer mais nada por essa relação. Não, mesmo separado, é uma relação, uma relação de ex-casal, senão, ela vai apodrecer como todas as relações. Não é porque você separou, que ela não existe mais, principalmente se o casal tiver filhos”, explica Lia.

Lia e Ivan criaram um canal no YouTube para discutir relacionamento
Foto: Divulgação

Uma das dúvidas que sempre aparece para Lia é sobre a certeza da separação. "Eu falo que certeza é 50% mais 1. Não tem 100% de certeza, não tem 80% de certeza, é muito raro. Geralmente a certeza é uma coisa que você vai buscando, você vai sentindo, vai pensando. Você vai ponderando, mas 50% mais 1 já é uma certeza. Então, muitas vezes a certeza é quase do mesmo tamanho da certeza do ficar, ela se diferencia por pouco. Acho que tem que prestar atenção na relação, tem que ter um conhecimento de si mesmo, de saber quando você está feliz, de saber o que você quer, muitas vezes procurar uma terapia”, pontua a jornalista.

Quando o divórcio acontece, ela deixa claro que as pessoas precisam ter em mente que há “vida lá fora e que a separação não é o fim de nada, e sim o começo de uma outra coisa”. Mais um ponto relevante, comentado por Lia, é que as pessoas precisam casar já sabendo que o relacionamento pode terminar.

“Eu acho que a pessoa tem que saber que o outro pode virar as costas e ir embora no dia seguinte. Não é mais assim, casou e agora a gente está amarrado pelas nossas propriedades, pelo nosso conceito de família. Agora não é mais assim. Essa instituição família é mais frágil e a gente tem que cuidar e olhar para ela de uma outra maneira”, diz a jornalista, frisando ainda que é importante cuidar de si e buscar ajuda com amigos e especialistas neste momento.

Terapia de casal como uma busca de si e do outro

Como uma forma de buscar entender os problemas entre os envolvidos em um relacionamento, a terapia de casal tem sido cada vez mais procurada, principalmente quando o casamento já está em crise e pelo menos um dos parceiros se mostra mais aberto para este tipo de cuidado. É o que explica a psicóloga Adrielly Sousa, afirmando ainda que o casal já chega em seu consultório com uma comunicação comprometida.

“O diálogo não fluiu, ambos estão rígidos e fixados em suas certezas acerca das questões e conflitos que enfrentam na relação. Existe muita mágoa diante de situações vividas e a sensação de não ser respeitado nem compreendido pelo companheiro, além da grande dificuldade de ouvir e compreender o outro em suas colocações. A medida que essa comunicação não flui, a percepção do outro não ocorre e a resolução do conflito, seja algo simples ou complexo, fica impedida”, comenta.

A terapia ajuda para que o casal consiga sair da rigidez relacionada ao orgulho e mágoas diante de situações vividas, para focar na busca do entendimento do outro e acima de tudo de si mesmo na relação
Adrielly Souza, psicóloga

A terapia atua no espectro individual e relacional de cada pessoa na relação. “O casal consegue resgatar pelo menos um mínimo de comunicação, além de perceber-se e perceber o outro de forma mais clara, sensata e congruente, facilitando assim a decisão de permanência ou término do relacionamento. A terapia ajuda para que o casal consiga sair da rigidez relacionada ao orgulho e mágoas diante de situações vividas, para focar na busca do entendimento do outro e acima de tudo de si mesmo na relação. É essencial que cada um consiga enxergar a si mesmo e suas implicações no relacionamento, o que está agregando de positivo e de negativo para a situação em que se encontram”, afirma Adrielly, ressaltando ainda que não é tão comum a existência de casais que conseguem passar pelo fim de um relacionamento de forma tranquila.

“Existe muito investimento quando se pensa numa relação, tanto financeiro como emocional. O fim de um relacionamento é quase sempre algo que gera sofrimento e frustração, pois no decorrer do dia-a-dia o casal acaba se desgastando muito, gerando mágoas, raivas e marcas emocionais, o que impacta para que o fim do relacionamento seja em meio a brigas e caos”.

A separação humanizada, expressão que tem ganhado cada vez mais força, é totalmente possível de existir, de acordo com a terapeuta. “Isso é totalmente possível quando ambos estão dispostos ao processo terapêutico, quando estão abertos a se perceber e assumir sua responsabilidade de como sua relação se encontra, assim como perceber o outro com empatia e compreensão. A terapia vem exatamente para que o casal consiga ter esse discernimento, para que ambos possam se encontrar em sua história, clarear seus sentimentos, dar resolução aos conflitos e seguir em frente. O processo não é simples, exige disposição e implicação de ambos, mas é totalmente possível e gera os mais diversos benefícios, tanto para manterem uma relação diferente e mais saudável no caso de decidirem permanecer juntos, como para seguirem com mais leveza e liberdade para outras relações no caso de decidirem terminar o relacionamento em questão”, comenta Adrielly.

Terapia individual como ressignificação de experiências

A terapia individual também é uma possibilidade para momentos como estes. Ela pode atuar em muitas frentes, inclusive criando mecanismos de compreensão e ressignificação dessas experiências do casamento, garante a terapeuta Camila Eugênio.

Ela afirma que, por mais que a separação tenha sido tranquila, sempre há uma das partes que se sente mais lesada e é para lidar com essas emoções que as pessoas procuram ajuda. “Eu acompanho muitos casos principalmente de mulheres, que é o público que mais se apresenta na minha prática clínica, e o que percebo dessa experiência é que ela é carregada de grande mobilização emocional. Costumo dizer inclusive que a separação amorosa é uma das maiores dores que o ser humano pode enfrentar. Existem muitas questões práticas a serem vivenciadas numa separação e muitas perdas também. Por mais que a decisão de separar tenha sido realizada em conjunto há geralmente aquele que se sente numa posição de abandono, rejeição, traição".

A terapia atua para que haja um crescimento pessoal e uma abertura para outras formas de se relacionar
Camila Eugênio, terapeuta

"Outro ponto que é frequente de observar é a ideia de fracasso em não ter conseguido manter a instituição do casamento. Aliado a isso, para os casados que estão em processo de separação precisam lidar com as questões práticas da separação, como bens materiais, finanças, moradia e uma série de fatores que modificam consideravelmente o universo pessoal do sujeito podendo trazer fontes de estresse, inquietação e tristeza”, completa.

O primeiro passo é mostrar que há um espaço de escuta e acolhimento para o paciente, segundo Camila. Nesse contexto, a terapia atua para que haja um crescimento pessoal e uma abertura para outras formas de se relacionar. “Embora a questão da separação possa ser considerada a queixa inicial de uma análise, o trabalho geralmente extrapola essa queixa e é muito interessante de acompanhar quando uma dor emocional pode lançar a pessoa a um processo de autodescoberta e enriquecimento pessoal. Geralmente a pessoa chega com baixa-estima, sem forças, esgotada e sem esperança sobre o sentido de sua existência. É importante fazer o paciente experimentar esse processo como um rito de passagem, muitas vezes doloroso e sofrido, mas inevitável”, comenta.